Candidata negra perde vaga para cargo docente por liminar da Justiça; decisão judicial não considerou lei de cotas
A Universidade Federal da Bahia (Ufba) divulgou neste domingo (1º) uma nota se manifestando sobre o caso de Lorena Pinheiro, docente impedida por uma liminar da Justiça de ser nomeada professora da Faculdade de Medicina. A instituição informou que cumpriu a determinação judicial, nomeando a candidata Carolina Cincurá Barreto – responsável por mover a ação – para o cargo, mas ressaltou que só tomou conhecimento do processo na fase de cumprimento da decisão.
O texto ainda afirma que a decisão foi firmada sem que a universidade fosse intimada a se manifestar. A Pró-Reitoria de Desenvolvimento de Pessoas (PRODEP), portanto, elaborou os subsídios para a defesa da universidade. Os documentos foram encaminhados à Procuradoria Federal, órgão competente para a representação jurídica da instituição, para as providências de recurso da decisão. O processo está em andamento.
“Infelizmente a história se repete e temos um caso que pode ser considerado um ato de racismo estrutural, em que instituições perpetuam ações que invisibilizam o negro e sua cultura. É por isso que o combate ao racismo deve ser uma luta constante do povo preto, pelo cumprimento das leis e obrigações do Estado perante a sociedade brasileira”, disse Emerson Aleluia, diretor da pasta de Igualdade Racial da APLB-Sindicato.
Entenda o caso
A Ufba realizou, em dezembro de 2023, concurso para professores do Magistério superior, regido pelo Edital n. 01/2023, no qual foram oferecidas 30 vagas para 28 áreas do conhecimento. Na área da Otorrinolaringologia foi homologada como primeira colocada a candidata Lorena Pinheiro Figueiredo, autodeclarada negra.
Ela não foi nomeada por conta de decisão judicial movida por outra candidata, que determinou à universidade, por meio de liminar, que “convoque a impetrante, classificada em 1º lugar, para nomeação, posse e exercício, a fim de assumir a única vaga aberta para o cargo”.
Com apenas uma vaga disponível para a função de professora adjunta na área de otorrinolaringologia, Lorena ficou em quarto lugar entre todos os candidatos e, por conta da lei de cotas, teria a preferência, conforme previa o edital do processo seletivo. No entanto, no último dia 21 de agosto, à espera da nomeação, a médica foi surpreendida por uma decisão da 1ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária da Bahia favorável à candidata Carolina Cincurá, que passou em primeiro lugar na ampla concorrência.
“Em virtude de a Ufba ter oferecido apenas 01 (uma) vaga para o cargo de professor de médico otorrinolaringologista, a aplicação dos percentuais de 20% e de 5% de reserva para negros e deficientes não pode suprimir a primeira classificação de livre concorrência”, diz um trecho do documento da Justiça. Mesmo assim, Lorena se sentiu “completamente violada”.
Durante o processo judicial, a Ufba defendeu que a seleção ocorreu corretamente, se posicionando de forma contrária à decisão da liminar. “Pelo exposto, concluímos que não houve qualquer irregularidade por parte desta Ufba quanto aos trâmites relacionados ao concurso oferecido pela Faculdade de Medicina da Bahia”, afirmou.
Lei de Cotas
A Ufba passou a cumprir a Lei de Cotas (Lei n. 12.990/2014) em todos os seus concursos considerando a totalidade de vagas do Edital e não aplicando qualquer fracionamento sobre especialidades ou áreas, a partir de dezembro de 2018. Anteriormente, esta lei era aplicada somente nas áreas com três ou mais vagas.
No caso dos concursos para professor do magistério superior das universidades federais, como as vagas por cada área do conhecimento são, em geral, inferiores a três, a aplicação da lei não era possível, inviabilizando, na prática, a política afirmativa de inclusão, objetivo da Lei de Cotas.
Segundo a universidade, a reserva de cotas seguiu a decisão do Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, proferida no ano de 2017 em Ação Declaratória de Constitucionalidade. À época, o juiz argumentou que os órgãos de Estado não podem alegar a divisão por especialidade como motivo para deixar de aplicar as vagas destinadas aos cotistas.
Assim, o candidato autodeclarado negro mais bem classificado em sua área de conhecimento é reclassificado em lista única, de acordo com a sua nota final, e ocupará a vaga imediata em sua área de conhecimento, ainda que esta seja única e a sua ordem na classificação não lhe garanta a primeira posição geral.
O percentual de 20% das vagas reservadas pelo Edital é sempre observado, na classificação geral do concurso. Após o resultado do concurso, os candidatos autodeclarados negros ainda são avaliados pelo procedimento da heteroidentificação, em comissão criada para este fim, de modo que seja verificada e confirmada a sua autodeclaração.
Com Informações do Jornal Correio