Volta às aulas na pandemia? Confira o artigo do professor Gildeci de Oliveira no A Tarde deste domingo
Por Gildeci de Oliveira Leite*
Ouço, vejo, leio, percebo clamores de uma parcela da sociedade para a imediata volta às aulas. Não sei, não imagino o tamanho dessa parcela, que pede um atestado de óbito pré-datado. Sim, pode ter algum exagero na afirmação do acerto no predeterminar a data: o prazo da nefasta eficiência do coronavírus tende a variar. Para os mais novos, que não viveram tempos predominantes de cheques pré-datados, e aos mais velhos esquecidos, informo que o tal título de crédito ou ordem de pagamento era emitido antecipadamente com data prometida para o destinatário ter o benefício. Explico, assumia-se a dívida e como garantia, o credor recebia o cheque antes da data do pagamento.
Um parágrafo de poucas explicações, só para dizer o que já foi sugerido no início desse texto e tem sido confirmado através dos fatos à nossa volta: reiniciar aulas presenciais nesse momento é sim predeterminar o aumento de mortes pela Covid-19. A cada dia recebemos mais más notícias, mais pessoas próximas perdem seus familiares, mais pessoas próximas a nós perdemos para a irresponsabilidade de nossos governantes. Sou um soteropolitano com alguns costumes de afro-baianidade e também de catolicismo popular. Tenho resistência a contar quantidade de mortos, quando forçadamente conto, termino com um “último com o cachorro” ou “último com a pedra”, sem desejar a morte nem do cachorro, nem da pedra, muito menos de seres humanos.
Entretanto, esse assunto e essa soma macabra, confirmadora da diminuição de vidas, têm sido rotineira. Perdemos inúmeras pessoas para a necropolítica. Diversos núcleos familiares foram dizimados e ainda há quem insista na volta às aulas presenciais nesse momento. Como sempre não faltam impropérios à docência. De preguiçosos a milionários às custas do serviço público, têm sido ofendidos professores, ofendidas professoras: haja calúnias. Durante a pandemia, os ataques à educação se intensificaram e muitos fingem não saber, que o retorno às aulas presencias seria um desejo da maioria absoluta dos profissionais da educação, caso todos e todas tivessem segurança sanitária.
Verdadeiramente, há muita gente sem querer saber ao certo o que devem defender, querem atacar violentamente a educação. Pois vejamos, não raro, pessoas defensoras do início imediato das aulas presenciais são assumidamente a favor da educação à distância. É preciso sorrir! Qual seria o sentido dessas contradições? Para gente assim, o importante é atacar a docência, principalmente pública, ainda que assinem de forma pré-datada atestados de óbitos. Contudo, esquecem que as antecipadas ordens de descréditos, podem ser descontadas dos seus ou de si mesmos. Devemos defender a vida e o fim das investidas de ódio. Paz!
Gildeci de Oliveira Leite é escritor, sócio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, professor da UNEB*