Servidor: estabilidade ameaçada

Um projeto de lei complementar que tramita no Congresso prevê a demissão de funcionários públicos após duas avaliações negativas de desempenho e produtividade. O projeto já foi aprovado na Câmara, recebeu emendas no Senado e retornará à Câmara para apreciação final. Se aprovado, vai acabar com uma conquista histórica do funcionalismo. Assim, os servidores perderiam um dos atrativos da carreira: a estabilidade.
O Projeto de Lei Complementar 248/98, em trâmite na Câmara Federal, disciplina a perda de cargo por insuficiência de desempenho do servidor público estável. A proposta já foi analisada pela Câmara, que a aprovou e a enviou para o Senado, onde recebeu emendas, modificando relações trabalhistas próprias do setor público.

 

VOTAÇÃO – A matéria voltou à Câmara e está sob análise na Comissão de Trabalho para ser votada nas próximas semanas. O relator, deputado Luciano Castro (PR-RR), rejeitou as mudanças do Senado. Parte da chamada Reforma Administrativa, a medida permite demissões por baixa produtividade, má conduta e falta de assiduidade e de pontualidade.
A avaliação de desempenho seria anual e feita por comissão formada por quatro servidores, sendo três estáveis. Quem tiver desempenho insuficiente (abaixo de 40% dos pontos) será submetido a capacitação ou treinamento. Mas se houver dois anos seguidos de desempenho fraco ou três anos ao longo de cinco, o servidor será desligado do serviço público.
Para Josemilton Costa, da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Serviço Público (Condsef), se aprovada, a proposta representaria um retrocesso. “Como é que vão denunciar um chefe corrupto, por exemplo, se não terão mais garantia de emprego?”, questiona.
O sindicalista acusa o governo Lula de estar por trás da proposta e aproveita para afirmar que boa parte dos servidores tem defasagem salarial histórica. “Existem apenas algumas ilhas de excelência, como Judiciário, assessores parlamentares e delegados da Polícia Federal. A maioria está com dificuldades de pagar suas contas”, disse.

 

DIREITO DE GREVE – O direito dos servidores públicos de fazer greve, como qualquer trabalhador, está garantido pela Constituição. Mas as regras para exercê-lo e coibir abusos, sobretudo em serviços essenciais à população, ainda faltam ser regulamentadas. Preocupado em evitar futuras ondas de paralisações no setor público, como a dos últimos meses, o governo federal pressiona o Congresso pela aprovação em pouco tempo de normas rígidas que completem uma lacuna de quase 20 anos na legislação.
As mudanças apontam na direção da realidade da iniciativa privada e vão afetar os nove milhões de trabalhadores em estatais, prefeituras e dos governos federal e estaduais.
“Não é possível alguém ficar 90 dias de greve e ainda receber dias parados. Aí deixou de ser greve e passou a ser férias”, desabafou, recentemente, em discurso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um ex-líder sindical.
Enquanto a Comissão de Trabalho da Câmara não aprova o projeto de lei de autoria da deputada Rita Camata (PMDB-ES), que regulamenta os direitos dos servidores à greve (PL 4497/01), o Supremo Tribunal Federal (STF) já estabeleceu, na sexta-feira, as regras válidas para a iniciativa privada (Lei 7.783/89) como parâmetro.
Os grevistas infratores, agora, poderão responder civil e criminalmente por abusos. Esse é também o teor do texto sob avaliação dos deputados e de particular interesse do governo Lula, que quer impedir longas paralisações em áreas como saúde, educação e segurança pública.
Os tumultos nos grandes aeroportos e as mortes por falta de atendimento médico em hospitais do Nordeste serviram de alerta para Lula e um estímulo às ações do Legislativo e Judiciário.
No fim de julho, o secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Duvanier Paiva Ferreira, criou grupo de trabalho só para elaborar proposta que institucionalizasse a negociação coletiva e o direito de greve na administração federal.
Basicamente, as propostas de lei complementar para regular a greve no setor público prevêem procedimentos mínimos para a deflagração do movimento ser considerada legalmente aceita, como número de participantes em assembléias, garantia dos serviços essenciais e a primazia da negociação permanente. Hoje, data na qual os servidores comemoram seu dia, muitos parecem não enxergar motivo para festa além da estabilidade no emprego e a aposentadoria integral, os maiores objetos do desejo da maioria dos trabalhadores do País. Só este ano, cinco milhões de pessoas se inscreveram para disputar vagas em concursos. “Há certa contradição entre o fato de o funcionalismo ser efetivado por um estatuto e poder entrar em greve indiscriminadamente, até por motivação política”, disse o ex-ministro do Planejamento João Paulo dos Reis Velloso.
Para o economista, o ideal é aproximar o sistema público do privado, conforme interpretação do STF. “A administração federal não pode demitir nem nada diante de uma greve descabida”, disse. Outro problema a seu ver é o Regime Jurídico Único adotado na contratação de servidores ao invés da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e que dão direitos plenos a funcionários de fundações. Por isso, ele defende o retorno de dispositivo da Constituição de 1967, que previa planejamento e acompanhamento do serviço público.
Uma alternativa seria privilegiar o lado mais profissional do desempenho da máquina federal, dando mais espaço para Parcerias PúblicoPrivadas (PPP) e concessões.

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