Morre Chico Pinto, um dos ícones da luta contra a ditadura militar

Morreu, no último dia 19, no Hospital São Rafael, em Salvador, o ex-deputado federal e ex-prefeito de Feira de Santana, Francisco Pinto. Internado desde 2007 por conta de complicações decorrentes de doenças respiratórias e renais, Chico estava há alguns anos afastado dos holofotes da ação política nacional, mas as marcas da sua atuação são e ainda serão sentidas por muitas gerações. Orador contagiante, articulista, fiel aos seus ideais, Pinto fez história na luta democrática antes, durante e depois do regime militar.
“Primeiro, um jovem e criativo administrador, eleito nas urnas e com votação expressiva; em seguida, um membro destacado da resistência à ditadura e, depois, um dos homens que mais contribuíram para a redemocratização do Brasil”. Dessa forma, e ainda emocionado pela notícia da morte recente, Haroldo Lima, presidente da Agência Nacional de Petróleo (ANP), resume a trajetória de Chico Pinto. Os dois estiveram juntos em momentos importantes da história recente do país, como na noite de 1° de abril de 1964, quando, ainda atordoados pelo Golpe Militar recém imposto, alguns dos principais líderes da esquerda baiana se reuniram na casa de Pinto, então prefeito de Feira de Santana. “Houve um deslocamento para Feira com o objetivo de montar uma resistência imediata ao golpe, tudo com o respaldo de Pinto, mas éramos poucos e tínhamos poucas armas”, lembra Lima.
Também presente na noite de 1° de abril, Péricles Souza, presidente estadual do PCdoB na Bahia, recorda que, mesmo depois de deposto da prefeitura, Pinto permaneceu na luta. “Ele foi um dos fundadores dos ‘Autênticos’, um dos setores mais à esquerda do então MDB, que abrigava, entre outros membros, militantes de partidos que naquela época estavam na clandestinidade, como o PCdoB”. Depois de deposto, Pinto voltou a ocupar um cargo eletivo ao ser escolhido para ocupar uma das cadeiras da Câmara dos Deputados, de onde comandou uma forte resistência ao governo militar. Para Haroldo Lima, a presença de Pinto na Câmara, como deputado federal, deu novas esperanças à população que não via saída para o fim do regime. “Ele criou uma expectativa através de uma frente de ação parlamentar, gerando a sensação que alguma coisa podia ser feita de forma legal contra a Ditadura”, afirma.
A atuação de Chico Pinto na Câmara chamou a atuação dos militares, que logo conseguiram um jeito de caçá-lo. Em 14 de março de 1974, Pinto discursou contra a presença de Pinochet no Brasil. O general veio ao Brasil para a posse de Geisel e sugeriu a formação de um eixo Brasil-Bolívia-Chile-Uruguai. O discurso inflamado denunciando a ditadura no Chile rendeu a Pinto a perda do seu mandato, mas manteve a coerência das suas ações políticas. No início de 1980, junto com Waldir Pires, Luis Leal e Rômulo Almeida,entre outros, Pinto ajudou a fundar o PMDB na Bahia. Foi no PMDB, e ao lado de nomes como Haroldo Lima, Adelmo Olivira que Chico Pinto fundou a corrente “Tendência Popular”, responsável por um posicionamento mais à esquerda do partido.

Grande orador

Apesar de curta, a administração de Pinto em Feira de Santana fez história. Foi durante a sua gestão que, pela primeira vez no Brasil, no início da década de 60, foi utilizado o orçamento participativo, atualmente praticado pela maioria dos governos populares e democráticos. Também ficaram na memória da população os grandes discursos promovidos por Pinto, que além de grande orador, tinha meios inusitados de cativar aqueles que o ouviam. Eram comum para isso os seus “aquecimentos” antes de subir ao palanque, quando ele se agitava e pulava, como um desportista antes de entrar em campo. Outra maneira de prender a atenção da platéia própria de Pinto eram os seus “desmaios”, momentos em que ele subitamente “apagava”, atraindo todos olhares, para só então iniciar um discurso como se nada tivesse acontecido.

Haroldo Lima afirma que com tenacidade  e fidelidade às suas idéias,Chico Pinto entrou para história política brasileira,de onde nunca mais irá sair.

De Salvador,
Rodrigo Rangel Jr.

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