Lançamento do livro de Deyse Luciano, do Colégio Estadual Sete de Setembro

Lançamento do livro de Deyse Luciano, do Colégio Estadual Sete de Setembro

O lançamento será nesta quarta-feira, 28 de novembro, na Livraria Saraiva, no Shopping Iguatemi, às 19 horas.

Prefácio

As raízes das religiões afro-brasileiras estão firmadas nas tradições religiosas trazidas do continente africano ao longo de três séculos ininterruptos do tráfico atlântico de africanos escravizados.
O processo de dinâmica cultural que levou à constituição no Brasil de um campo religioso peculiar envolveu não só o tempo, mas também as condições históricas que exigiram do escravizado a dissimulação de suas práticas religiosas originais; a fusão gradual de práticas africanas diferentes, pela convivência cotidiana de seus fiéis em situação de extrema desvantagem social a escravidão; a absorção de outras crenças e sua introdução no corpo de doutrinas originais, especificamente crenças indígenas e euro/portuguesas.

Dessa dinâmica, cujos ritmos se perpetuam e fazem parte do próprio universo da cultura resultaram as diferentes expressões da cultura afro-brasileira, da qual na Bahia, o candomblé constitui-se sua maior representação.
As raízes do protestantismo brasileiro, por sua vez, estão em grande parte firmadas nas tradições das igrejas protestantes norte-americanas que, no século XIX, por motivos históricos e em cumprimento de projetos de expansão missionária elegeram, juntamente com outras regiões do mundo, o Brasil como campo de exercício de um programa de evangelização destinado a disseminar o que se acreditava ser a verdadeira mensagem e forma correta de se praticar o cristianismo. Dentre os diversos grupos que dividem o protestantismo, o batista firmou-se na Bahia partindo de uma ação agressiva e combativa ao campo religioso predominante, oficialmente católico.

A combatividade da propaganda batista no Brasil (e na Bahia em particular) decorria de duas questões fundamentais: a desqualificação da cultura brasileira, considerada pelos missionários como atrasada, supersticiosa e inferior; a crença na inferioridade da religião brasileira, controlada oficialmente pela Igreja Católica, frouxamente doutrinada por ela e marcada pela permissividade face ao convívio com as expressões da religiosidade popular, essencialmente africana.
De maneira geral a atuação missionária das igrejas protestantes norte-americanas no Brasil originava-se da orientação de associações organizadas no Sul dos Estados Unidos, área marcada pelo conservadorismo e pelo fundamentalismo religioso. Todavia, lá mesmo nos Estados Unidos, a unanimidade e a concordância estavam longe de marcar as relações entre os diferentes grupos protestantes, o que explica dentre outras razões, o afastamento de uma igreja batista no inicio do século XIX em Los Angeles, para desenvolver uma doutrina e uma prática fundamentada no ¿batismo do Espírito Santo e na orientação doutrinária baseada no fenômeno do pentecostes (pentecostalismo). Trazidas para o Brasil no inicio do século XX, doutrina e práticas pentecostais encontraram campo fértil para sua expansão na população pobre e afrodescendente da Bahia, malgrado sua afirmação de repúdio às práticas do candomblé.

São essas duas vertentes a do candomblé e a do pentecostalismo praticado pela Assembléia de Deus que se encontram, se confrontam e convivem na sala de aula da escola onde Deyse Luciano leciona como professora de História. Oportunidade impar vivida por uma Professora Especialista em História e Cultura Afro-Brasileira, título resultante de um Programa de Pós-Graduação Lato Sensu realizado na Bahia em cumprimento à Lei 10639/2003; oportunidade impar para uma jovem professora afrodescendente lidando com classes formadas por uma maioria de alunos também afrodescendentes; oportunidade não só para viver esse momento histórico como também para por em prática aspirações, conhecimentos e métodos reunidos nos últimos anos de sua especialização profissional.

Observadora atenta do entorno onde trabalha, num bairro populoso do subúrbio ferroviário da cidade do Salvador na Bahia, Deyse percebeu a sala de aula como um microcosmo de universo mais amplo, onde a diversidade religiosa não devidamente compreendida nem aceita passou a constituir-se fator de estranhamento e até de tensão entre fiéis de diferentes grupos. A publicação, em 2003, da Lei 10.639 levou para a sala de aula a obrigatoriedade da inclusão dos estudos da História e da Cultura Afro-brasileira e Africana, dando um passo significativo em direção ao reconhecimento da participação do africano e do afrodescendente na construção da sociedade e da cultura brasileira, mas ao mesmo tempo passou a exigir formação específica para os educadores ligados diretamente à sua aplicação.

Uma formação destinada a garantir a atuação competente e proativa do professor na escola buscando a efetivação dos princípios que norteiam a cidadania: consciência dos direitos, cumprimento dos deveres e respeito ao outro.

O trabalho aqui apresentado resulta da formatação de sua monografia para a conclusão do Curso de Especialização já referido, no qual tive o prazer de ser sua Professora e Orientadora. Trata-se de um estudo que procurou responder à problemática central quanto à situação do jovem negro evangélico no caso desta pesquisa negro pentecostal da Assembléia de Deus na escola e na igreja, no que diz respeito às restrições estabelecidas pela Igreja e ao discurso da diversidade e da tolerância cada vez mais divulgado pela Escola. Em suma, pergunta a jovem Professora …é possível ser negro evangélico no universo cultural baiano. Os caminhos da pesquisa e do estudo trilhados por Deyse Luciano para buscar possíveis respostas estão descritos neste trabalho, ao qual recomendo leitura detida, despida de preconceitos e aberta a novas abordagens.

Você pode gostar de ler também: